Ai que levas um processo em cima. Deixa-me andar por aí sem causar grandes ondas.
E quando tu o que sou é mar recheado de ondas, ritmos e palpitações.
Deixai-me fugir dos processos. E não desafiar a autoridade, seja a parental, societal e piar fininho para andar dentro da legalidade.
E onde está o questionar? Os ditames do certo e do errado que tantas condições, limites e fronteiras colocam à expressão do ser.
Procuramos o cómodo, o arrumado e sossegado, o penso rápido quando algo dói.
Não faças pó, não incomodes, não dês trabalho. Deixa-te estar. E aí começa a adulteração para não sentir e questionar. Recordo-me das crianças, da sua curiosidade, das perguntas incómodas, das suas aflições, impertinências, repetições, a necessidade de chamar atenção, de falarem, de se mostrarem, da facilidade do afecto, da honestidade crua e da repressão, do não se diz, não se faz, senta-te, não se brinca, não se faz barulho.
E a expressão calada aos poucos vai sendo silenciada até que cai no esquecimento. E vem o sintoma mais tarde revelar algo mais. E vem a pílula mágica colmatar, vem a urgência por resolver e matar a aflição que se sente.
Quer-se evitar o processo, arrancar o mau estar. E olhar para dentro para aflição, olhá-la de frente, acarinhá-la exige atravessar a negação, a revolta, a zanga, a tristeza, a angústia, a dor e dizer sim.
E depois de dizer sim e acarinhar ter a força suficiente de largar o apego ao sintoma. É que também nos tornamos escravos das nossas próprias prisões. Identificamo-nos com elas. Ficam-nos familiares. E voar do ninho familiar implica experimentar lugares novos, partir à descoberta. E acompanhar-se na travessia solitária de ser responsável e autónomo por si.
E mais do que chegar é ter a coragem de partir. De se inteirar e atravessar cada proposta, cada processo que a vida sempre convida.
Há sempre montanhas por subir, pesos por largar, aprendizagens por saber e coração por abrir.
Processar-te é saber-te caminho e jornada inacabada. E estás sempre a caminho. Recorda-te és processo, processa-te cada vez melhor.
Faz uma boa digestão do que vem e como vem. Elimina o tóxico, transmuta, aprende as lições e não mates os mensageiros do caminho. Alguns vêm só de passagem, outros repetem e repetem até que percebas onde estão as feridas e os recursos.
É que onde está a ferida também está o dom. E para aceder há que ir lá olhar, aceder, reconciliar, inteirar o que ficou quebrado e separado.
Tudo é alimento e sustento queiras tu processar o útil. E sempre há utilidade. No profundo do mar estão as pérolas e para isso temos de chegar às conchas mágicas e abri-las.
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Cuspidelas