Passagem para a outra margem. Recordo-me de numa formação de constelações de se falar passar para o outro lado do rio. Atravessar. Deixar para trás o passado, despedir das origens com agradecimento e seguir avançando para o novo destino.
E avançar significa romper o conhecido. Atravessar o mistério e os véus. E claro que dá medo. Que é assustador. É algo que morre e apenas fica o mistério.
E o mistério é algo maior do que nós.
E ela avançava passo a passo para a transformação. Para deixar-se ir e render-se ao vazio.
Quando se começa a cair a pique e parece não chegar ao fundo há um momento em que se solta o controlo, já não importa que páre e começa-se a desfrutar da queda livre. Há uma parte que flutua.
Era-lhe pedido que saltasse. Se atravessasse. Sem pressas, saboreando cada momento. Cada onda.
Cada vírgula está colocada no sítio certo. Deus não dá ponto sem nó, há sempre caminho e amparo. Estamos sempre a ser guiados.
E se pararmos para escutar a Voz sábia que levamos dentro, entendemos que está, que a serenidade mora dentro, que tudo está bem. Que é a personalidade que saltita desenfreada se a deixarmos sem rédeas a criar o tumulto.
E ela observava-se tranquila perante o incerto e a tempestade ainda que antes a cabeça tenha criado cenários, anseios e chegado o momento tudo se compunha.
As pessoas, os encontros, as conversas, os apoios, a gentileza, e encontrava amor em cada gesto. E apanhava-se ainda na resistência residual que baixava a guarda perante a vida e os acontecimentos.
Para onde vai a seguir? Sabe literalmente o passo seguinte, mas não tem como prever quem virá a seguir desse passo dado.
E confia. Vamos.
A viagem é aventura e somos turistas na nossa própria experiência. Curiosa com o que vou encontrar, escolho abrir, curar, abraçar e amar. E fazer essa escolha não é fácil… porque é abrir o o peito a todas as facetas de cada palavra. Esculpir. Soltar as ilusões e fantasias, crescer.
É que a criança sonha e alimenta a parte onírica e inocente, o cor de rosa. E ser adulto é incluir o espectro de todas as cores. Incluir o lado B, todas as partes com compaixão.
A passagem para a Condição que é tornar-se humano e não o Deus perfeito e herói.
Ser mana de mim mesma, a melhor namorada, amiga, amante, mãe e mulher. E cada palavra tem em si uma profundidade a ser vivida e integrada que implica presença diária, a cada momento. E ter a capacidade de ser honesta e escutar o que vai dentro.
Era uma passagem mais, uma viagem mais, desta vez dentro de si, no corpo, com o corpo, para que se pudesse sentir mais.
Vem não quando queremos, mas quando estamos preparados para ir a mais uma voltinha dentro. A vida manda-nos o bilhete, só temos de apertar o cinto e apanhar o avião, o barco, o comboio ou seguir pelo próprio pé.
A ver quem chega e qual será a próxima paragem.
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Cuspidelas