Regressar


 Regressar é fazer novos caminhos, ainda que aparentemente pareça que se volta aos mesmos lugares. Já não está a mesma. Voltar ao conhecido é querer agarrar o palpável, sentir o aconchego e o conforto do aparente conhecido.

E já tudo saía do lugar. As lentes não eram as mesmas. E tudo tinha um novo significado. E voltar a pisar esta terra de uma nova perspetiva, com tudo muito novo era ainda desconfortável. Encontrar o seu novo lugar. Escutar-se. Observar-se e acompanhar-se neste novo corpo e desconforto de como se acomodar na nova pele.

A que sente mais profundo, a que sente o toque penetrante do vento na pele. E a que solta mais facilmente a lágrima e o sorriso. A que sente a fragilidade, a dor e também o amor e a gentileza da brisa, dos olhares, toques e afectos. Uma parte de si morrera e outra estava agora a renascer.

Era-lhe pedido fé e confiança. Dar tudo. Dar de si. Doar-se por inteiro. E acolher-se em cada recanto seu. Perceber-se estrutura e limites. Estar atenta aos sim e não. E o respeito pleno por cada parte sua. Nada a negar, criticar ou julgar e fazer espaço para dizer sim a tudo que se emergia.

As armaduras começavam a desfazer-se. E quando vinha a pena por se sentir frágil, colhia as penas para que pudesse construir as suas asas. Afinal escolhera vir a esta terra aprender a amar melhor. Escolhera a dedo as lições para que pudesse mandar abaixo os falsos poderes, prepotências e impotências e fazer o amor com as partes que lhe pediam nutrição.

Ser família era em primeiro lugar dizer sim às suas células, ao sistema, corpo e templo que habitava para que reunisse, incluísse e pudesse receber a família sangue que a permitiu chegar cá, com a respetiva herança. Dizer sim, receber tudo, pôr ordem dentro de si. É legítimo estar cá, existir e ocupar o lugar na sua pele. É dizer sim à vida, ao amar e ser amada.

E derrubar as amarras, as armaduras, as desculpas.

Vinha mais aberta, nutrida. Pronta a olhar para as dores que de si escondia. Dizer sim ao que é, com orgulho por ser o que é. E nesse cuidado amar e curar melhor.

Era inteira, via-se inteira.  E pedia que a sua alma cada vez se encarregasse melhor de se cumprir aqui.

Sabia que trazia um coração gigante, e estava curiosa para o sentir e conhecer melhor.

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