A beleza está nos olhos de quem vê



E eu sou míope com cheirinho a estigmatismo. Também pode haver explicações interessantes e psicossomáticas a explorar sobre este tema. Mas isso agora não interessa nada.

Ora beleza, conceito muito giro, aquilo que nos é agradável aos olhos e ao espírito. Temos alguma concordância acerca deste conceito,contudo, a subjectividade perante este conceito já poderá contribuir para a divisão das opiniões quando toca a efectuar uma análise e avaliação. Há que estabelecer parâmetros e critérios para validar a análise e fundamentá-la, mas o que é certo é que a evolução dos conceitos vai permitindo também uma evolução dos padrões. E o que ontem não era belo, hoje pode ofuscar-nos e ser uma beleza extraordinária e vice-versa. Portanto, chego à conclusão que o conceito de beleza é totalmente variável e temporal.

Por mais que se queira criar uma opinião consensual sobre a classificação do que é que a maioria dos comuns mortais considera como beleza e até se consiga chegar a alguns consensos, nomeadamente a paisagens naturais, monumentos, etc, etc - a avaliação sincera não consegue ser isenta daquilo que nós somos no momento preciso da avaliação. Se estamos tristes a beleza vai-nos parecer feia e cinzenta; se estamos alegres vai-nos parecer uma beleza estonteante.

Tudo o que vamos testemunhando,vivendo e experienciando vai-nos permitindo desenhar o quadro de nós próprios, uns dias uma tela colorida e transbordante, outras uma tela em branco e outras ainda mais obscurecida. E o que é certo é que vamos traçando o nosso quadro, enchendo-o de tintas. A nossa vida enche-se de pessoas, histórias, episódios, problemas, soluções, desgraças, alegrias para nos mostrar a riqueza e a diversidade que existe neste mundo tão grande e tão pequeno em simultâneo.

E não é isto beleza? Para reconhecermos aquilo que nos é agradável temos de provar o gosto amargo do que é feio, sujo, porco e mau.De outra forma não teríamos os padrões, não teríamos a oportunidade de os transformar, de evoluir com eles e de perceber essas mudanças ao longo da vida. E parar e pensar, poças há uns anos pensava daquela maneira, como é possível, e hoje vejo um quadro bem maior, com outras perspectivas mais sólidas e se calhar daqui a uns anos para a frente vou parar e dar por mim a fazer uma revisão e perceber que mudei de conceitos, que cresci e amadureci determinados conceitos e experiências e assim por diante.

E há uma beleza muito subtil por detrás de tudo isto, perceber como as peças se vão juntando, como tudo se encaixa numa perfeição tão silenciosa. Os momentos que surgem, as pessoas que vão e vêm e que estão lá naquele exacto momento para uma troca, quer seja um sorriso, uma indicação onde fica determinada rua, uma ajuda a abrir a porta,um bom dia, uma batida no carro, uma encomenda que não chegou na hora acordada.

Há muitas palavras que são professadas para nos manterem alerta para esta dualidade do bem e do mal, do certo e errado, do belo e do feio, como o pecado, o castigo. Ainda que professadas como um peso pesado de incutir o medo da represália, têm o seu sentido e efectivamente são os nossos valores que vão ditar a interpretação à informação que recebemos. Acredito que todas as nossas acções têm as respectivas consequências e segundo os meus valores, se eu prejudicar alguém com esse intuito eu receberei de volta o resultado dessa acção. Pode não ser de forma imediata, mas fica registado. Se somos família e todos somos um, quando faço mal a alguém é a mim que estou a magooar.

Acho muito giro, com a piada que não tem, ver pessoas revoltadas com o sistema e que está tudo mal e é só corruptos, algumas até têm uma atitude interventiva de denunciar, criar redes de apoio a causas, entre variadíssimos exemplos que agora não me ocorrem. Não vou negar que me entristece, assim como não vou negar a minha ignorância de não acompanhar o sistema e de estar um pouco à margem. Talvez seja uma postura mais confortante não saber... talvez.

Todavia, a minha visão é de que mesmo não acompanhando, como por vezes acompanho as novelas, que pelo menos têm sempre a pitada do romance no meio, tenho a visão geral do que se passa à minha volta. É no fundo como uma novela, posso ficar 2 semanas sem ver os episódios e dá para apanhar sempre. O tempo de evolução dá para apanhar sempre o fio à meada.

Nós estamos deste lado de cá, somos o zé povinho,como diz o ditado popular "Casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão". É um pouco aquilo que se passa connosco. Levamos metade da vida a queixar-nos de quem nos faz mal e claro os culpados são os que detém o Poder - Governo e Banca, para não falar nos grandes grupos económicos e afins. Resultado: encostamo-nos ao que está mal, perdemos a motivação, pois que não vale a pena insurgir-se contra o sistema e assim se vai sobrevivendo ao resto dos dias das nossas vidas. Excelente!

Mas esquecemo-nos que também somos pessoas feitas da mesma matéria do que aquelas que estão no poder. Que se tivéssemos lá chegado não saberíamos se faríamos diferente. Nós falamos porque estamos na plateia a ver o filme. É como no futebol o pessal vibra tanto que temos treinadores nas bancadas em vez de espectadores quando a festa corre menos bem. Temos um umbigo muito grande para ver as falhas dos outros e não assumirmos as nossas. Nós somos ambiciosos por natureza, buscamos um ideal de beleza e de perfeição constante pela frustração de sermos imperfeitos. Se não levarmos uma patada de vez em quando para irmos baixando a crista e perceber que somos todos iguais, vamos pela escadaria acima derrubando quem está à nossa frente. É por maldade? Não. É por cegueira, é a ânsia de realização e satisfação pessoal. É o querer ser reconhecido pelo seu mérito.

Nós fomos educados assim num espírito de competitividade, a descoberta das capacidades e habilidades do Homem tornaram-no sedento por querer mais e mais. E todos fazemos parte disso, eu, tu,ele,nós, eles.

Se queres mudar o mundo, começa por ti. Esta ficou-me. A crítica é necessária, pois precisamos de analisar e perceber o que ressoa connosco, nem que sejamos porquê que criticamos. E aí isso digo, obrigada pela realidade que tenho à minha frente que o meu país me mostra para perceber que não quero ir pelo mesmo caminho. Se eles não me estivessem a dar este alerta, quem sabe não estaria a repetir os mesmos erros, seja por querer mostrar poder, quer fazer obras para mostrar como somos imponentes e grandes e até emprestamos dinheiro à Grécia, porque somos muito solidários e até não precisamos do dinheiro para pagar as dívidas.

E perceber que todos somos um pouco assim, se não estivermos atentos.Quantas vezes nós seja por sermos um coração aberto, quer por não termos como dizer não, quer para agradar nos expomos a situações, como usando o mesmo exemplo, emprestamos dinheiro e até ficamos na mão, prejudicados e até com alguma carência. As cunhas que agora tanto denunciam nos cargos públicos do ministério, sempre houve e em situações de menor escala e nunca tiveram impacto, nem deram importância, sempre foi permitido por todos. Portanto se tenho que tirar o chapéu é ao ministério por ter repetido a situação de forma escancarada para que pudesse denunciar todas as situações que ocorrem e que somos nós. Será por isso que ficamos tão escandalizados?

Eu prefiro retirar a beleza das experiências que experiencio e testemunho, pois até as mais dolorosas e difíceis de aceitar, a curto médio e longo prazo vão-me mostrando o seu lado luminoso. São a minha escola gratuita, nem preciso de pagar propinas, pronto okay, pago com o corpinho, eh, eh, eh...

Todos temos as nossas qualidades e defeitos e eu acredito que todos somos inocentes e bons. Em cada pessoa há uma beleza enorme, às vezes as experiências vão marcando e pesando e tornam essa beleza mais difícil de ver, pois a pessoa camuflou-a.

Às vezes queremos protegermo-nos tanto, esconder a nossa sensibilidade e aquilo que somos, pois achamos que as pessoas vão abusar e aproveitar-se da nossa bondade. Mas o que é certo é que não conseguimos esconder aquilo que somos, vai transparecendo e os outros vão topando e vão puxando por nós. Resultado: o esforço de protecção é a dobrar e passamos a reprimir quase como disciplina imposta o que devemos ser e como devemos agir. E o mesmo se passa com as pessoas com carência de bondade e que o querem ser à força. A sinceridade e a verdade podem ser conceitos, palavras bonitas de se ouvir dizer e mesmo de pronunciar. Mas a verdade essa não se diz, escuta-se.

Por enquanto, apesar da miopia, agradeço aos meus lindos olhinhos por verem este mundo não cor-de-rosa, mas colorido de muitas cores, todas, uma manta de retalhos que se vai moldando ao sabor das vontades.

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