O querer fugir




Inocência esquecida ou melhor dizendo adormecida... Será? Palavras medidas, emoções contidas, na ilusão de querer esconder aquilo que o coração não deixa.

Todo o corpo se expressa, denunciando-nos. Os gestos que não se conseguem controlar, que simplesmente saem sem querer...será aí que a inocência se revela,uma inocência que não se quer assumir de corpo e alma. Mas ela está lá, sempre esteve.

E nós teimosos queremos fugir do que somos, do que sentimos, na estúpida esperança de acharmos que conseguimos ter tudo sob controle. E a prática mostra-nos a ilusão de que conseguimos, que estamos firmes, que conseguimos contornar as situações. Rimos, brincamos para descomprimir e dar leveza àquilo que nos toca, para ver se o outro não percebe que nos tocou. Cortamos os assuntos, desviamos a conversa, há assim uma vontade urgente de ir à casa de banho... vou ali e já venho. Na esperança de quando voltar o assunto já não seja retomado.

Respiro fundo, acendo um cigarro, bebo um copo para disfarçar qualquer gesto que me possa denunciar, um toque de cabelo, o telemóvel que de repente dá tanto jeito... são os truques malandros que se arranjam para dissimular o nervosismo, o constrangimento,o pouco à vontade. Nós teimamos em representar como se estivéssemos a ser avaliados em cima de um palco, mas esquecemo-nos que estamos todos em pé de igualdade.

Eu fujo, aliás corro com todas minhas forças sempre que o assunto toca o coração. Costumo dizer adoro cantar e tocar, mas não tenho jeito nenhum, desafino a 200%.Pode-se dizer que o meu coração não toca, desafina... eh, eh, eh...e como não o sei afinar, fujo para não ferir os ouvidos de ninguém.

Teoria, tenho-a muita, visão alargada com uma percepção muito gira... pudera tenho o distanciamento todo, possível e imaginário. Tenho medo de soltar a corda e deixar-me ir com a maré...não sei nadar lá muito bem, será por isso, ah, ah, ah....

É giro. As desculpas que arranjamos para nós e para os outros para fugirmos, para não encararmos, para não nos entregarmos. Enchemo-nos de justificações e culpamos o exterior, só para não termos que nos encarar de frente e assumir a nossa responsabilidade. Preferimos continuar a fugir.

Sou perita... mas o que é certo é que corro, corro, e continuo no mesmo lugar, quase como se estivesse correndo em círculos ou no labirinto do qual não consigo achar a saída. E não a encontro, porque fujo,porque parece dificil parar e olhar-me nos olhos e perceber o que o coração sussurra. Não me apetece... estou tão bem sossegadita, porquê arranjar sarna para me coçar.

E o que é certo é que mesmo paradinha, as coisas vêm ter comigo. Já chega de fugir. Já nem a campainha te salva. Chega uma altura em que já fugiste tanto que já não podes voltar para trás e e encontras-te só em cima do precipício e só precisas dar um passo para te deixares ir... Aparentemente parece que estás no mesmo sítio,mas os cenários mudam "o vento que corre pode ser igual, mas as folhas movem-se sempre de forma diferente".

O percurso, a correr ou caminhando é apenas uma escolha para chegar lá...onde quer que seja, mas lá. tu e o teu coração, ele e tu e o precipício.

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