A minha orquídea

Era outubro quando a última flor secou e caiu. Até aqui os seus ramos têm-se apresentado despidos. Pacientemente tenho vindo a admirar o seu corpo nú. Meses de espera, sem que um botão se revelasse. Há três semanas mudei-a de sítio para testar se poderia precisar de mais luz e de outro ambiente. Ela não fala comigo. Tento-lhe adivinhar os gostos, se tem sede e o que lhe agrada. E eis que esta semana assim no meio do nada vejo três rebentos gigantes, como se se tivessem aparecido num gesto de mágica. Apeteceu-me abrir a goela para o mundo e gritar, "a minha orquídea tem novos rebentos a nascer". E eis que este é o espaço e o momento para o fazer. Perceber que em momentos fiquei triste pelo tempo que demorava a passar sem mostra de novos rebentos e que já achava que provavelmente nem tão cedo... mas sempre paciente, a regá-la, a cuidá-la. Algum dia ela iria mostrar-se, não quando eu quisesse, mas quando ela achasse ser o momento oportuno. O momento dela. E agora aprecio a gestação do rebento e celebro. Há vida na espera, na quietude. Quem espera desespera ou também poderá ser quem espera aprecia. Aprecia o caminho, observa as mudanças, que são tão subtis, quase invisíveis aos olhos, mas que se mostram, quando arranjam o seu tempo para se revelar. E a olho, vou experimentando, mudando de local as plantas que enchem de cor o meu ambiente e vou descobrindo a pouco e pouco qual é o espaço que gostam mais, qual a quantidade de água, como gostam de ser tratadas. Vou respeitando o seu ciclo. Umas vezes mais floridas, outras mais despidas, crescendo em altura e não em volume de folhas ou flores. Elas têm a sua vontade própria, as suas raízes, eu apenas tenho de ir aceitando e respeitar. Como acontece com as pessoas, com as relações. Às vezes, o mundo cá fora faz muito barulho e, ninguém se ouve, ninguém se entende. Mas no silêncio entre as palavras e nos ciclos da natureza tudo se torna mais simples e claro. Experimenta-se, erra-se, muda-se e o nosso interlocutor vai-nos dando sinais como resposta aos nossos estímulos.