Pérolas

Cada dia nos preenche com dados novos. Acasos, situações inesperadas que nos deixam surpresos, comovidos e mais ricos por dentro. Não se sabe bem o que fica, mas sabe-se que fica. Hoje sou surpreendida com uma senhora dos seus 50 e alguns anos mais, que em passo acelerado passa pelo meu carro. Qualquer coisa a fez parar de repente e voltar atrás para falar comigo e me pedir boleia até Faro. Meio atordoada com a situação e o pedido, acedi. Trouxe a senhora até Faro, não lhe sei o nome, mas veio o caminho todo falando comigo. Contando a sua história e tormentos. A preocupação com o filho que estava internado na psiquiatria, por tentativa de suicídio. Uma história triste. A senhora atormentada por não conseguir encontrar explicação, para um rapaz tão novo, 29 anos, querer fazer-se tanto mal. Dá que pensar. No amor da mãe pelo filho, que só lhe quer o seu bem. E no desespero do rapaz que o leva a tamanha decisão de colocar fim à sua vida. A mãe que sempre lhe dera tudo, um curso finalizado, em farmácia, e o desemprego é o motivo que a mãe aponta no desespero do filho. Não está bem da cabeça, o que lhe passará na cabeça, não reconheço o meu filho nos seus comportamentos. Não parecia ele, dizia ela. Numa dor silenciosa de mãe, que de cabeça erguida juntara a sua força para buscar alternativas e poder ir ver o filho. Tinha perdido o autocarro e não tinha como chegar a Faro. Reuniu a coragem e a vontade de arranjar uma solução, para chegar ao destino. Por acaso, fui eu que lhe proporcionei a boleia. Foi um momento de ligação muito profunda,ainda que a viagem tenha sido cerca de 15 minutos. Uma passagem breve, mas marcante. A senhora grata por esta "boleia" quis pagar-me, dar dinheiro para café e a perguntar como poderia pagar.Deixei-lhe uma mensagem de força para que tudo corresse pelo melhor. O meu gesto foi gratuito, não me custou nada, apenas me enriqueceu um pouco mais comi ser humano. Gerou-se uma troca, uma partilha. As dores, que todos partilhamos, apenas com histórias de vida diferentes. A impotência de uma mãe perante um sofrimento calado de um filho que se recusa a pedir ajuda. O amor incondicional que nos une a todos para darmos as mãos, em momentos de aflição, quando não conseguimos que seja antes. Mostrou-me o quanto somos frágeis, como o medo de viver nos torna tão fechados, a ponto de querer desistir. Mas em simultâneo a força, a esperança, a vontade e a garra de superar e continuar a caminhar. Obrigada senhora, onde quer que estejas, pela boleia :)

Comentários

Enviar um comentário

Cuspidelas