Dor



Quando páras e perante o silêncio e o estar só vêm as memórias que te fazem refletir as dores escondidas. Aquelas que enquanto te manténs em movimento e ocupada parecem não ter lugar para se manifestar e se fazerem ouvir.


E sim é importante a paragem. Sentires-te, deixares vir ao de cima essas dores que estavam ali escondidinhas a um canto, abraçá-las e perceber o que têm para te dizer. O que tens para aprender com elas. Deixa-as sair.

Sim, incomodam, fazê-las presentes, queremos que elas desapareçam rápido. Até porque no exterior não há soluções para elas. E sempre ouvi dizer, o que não tem solução, solucionado está. A vida pede paciência, preserverança e ação.


Sou responsável pelas minhas dores, ainda que inconscientemente as tenha atraído. Poderia pensar, que mazinha que sou comigo. Pois é, por vezes somos, escolhemos esta estratégia para que possamos olhar e ver-nos e curar as feridas que trazemos desde sempre.

E o exterior faz tantos convites para que continuemos a deixar as dores bem cobertas. Distrações tão atrativas para saciar um desejo momentâneo. Aqueles reencontros com o passado, os elogios e palavras bonitas que reativam memórias, que fazem sonhar e desejar nem que seja por mais uma vez repetir a dose.

E assim as dores vão permanecendo encobertas, quietinhas, ocupadas com a história do momento. É preciso coragem para abrir a ferida e responsabilizar-se por ela. É como ir ao ginásio regularmente, sabemos que saímos de lá melhores, mas custa o passo de ir, e dói o exercício. O desafio é sempre saber se conseguimos terminar o treino. O limite parece que é logo atingido, mas depois mais um pouco de paciência e muita respiração, passo a passo, consegue-se cumprir e, melhor ainda se fica com pica para repetir a dose. E a cada dose vai doendo um pouco menos, o corpo vai evoluindo, ganhando estrutura muscular para ir cada vez mais longe.

Assim é com as nossas feridas. Quanto mais fundo formos mais dói, mas vamos ganhando estrutura para que doa menos e melhor capacidade para lidar com as dores. Estamos mais atentos, percebemos mais rápido as nossas estratégias de sabotagem e de fuga e encaramos.

É essencial parar. Escutar. Perceber onde estou bem? Onde me sinto cansada, onde estou carente. O que me preenche, o que me esvazia? Onde me culpo, onde estou magoada e zangada? Onde sinto que falho? O que quero para mim?

São perguntas nem sempre fáceis de responder, implica que tenhamos de ir bem lá ao fundo, para que as respostas venham à luz.

Mas é um caminho inevitável. Tens de lá ir. A bem ou a mal, a vida pede-te que faças esse trabalho contigo.

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