O valor das coisas

Quanto vale o teu valor?

Sabemos que vivemos num mundo em que o valor de troca é baseado no dinheiro. E a tudo é atribuído um valor simbólico traduzido em euros (por enquanto é esta a moeda corrente). Então é necessário atribuir significado e valor que seja traduzido em número.

O valor que atribuímos às coisas está de acordo com o nosso sistema de significância e valores intrínsecos. Para mim pode ser mais significante investir num livro de 30€ do que num jantar com o mesmo valor e para outra pessoa ser o inverso. Não há aqui julgamento sobre o que vale mais ou menos. É apenas a tradução de como cada um lê e percepciona o mundo segundo o seu sistema de atribuição de valor. Daí que o caro e o barato sejam adjetivos qualificativos muito subjetivos. Mas é necessário quantificar valores para que se distingam produtos e serviços segundo os critérios, alguns padronizados e estabelecidos por acordos de mercado, uns declarados, outros tácitos e outros ainda sem qualquer regulação. Tornando os critérios de avaliação e escolha ainda mais subjetivos por parte de quem declara um valor e por parte do consumidor.

Agora falemos de outro tipo de valor. O teu? Qual o teu valor, se tivesses de traduzir um número, um preço, qual seria o teu criterio, a tua base de sustentação para tal?

Sempre tive uma questão que me limitou para determinar um valor. Tudo o que estudei e aprendi até hoje foi para me saciar e satisfazer, para me cumprir enquanto ser humano na busca de si próprio. Claro que as aprendizagens se tornaram em conhecimento e competências adquiridas. Mas foi uma consequência natural e não uma finalidade.

Durante alguns anos debati-me com o não conseguir ver-me. Os talentos eram tão naturais e fazia de coração que não conseguia enxergar. Ficava feliz por poder ser e usar os meus talentos e se o resultado era ajudar alguém, excelente. Recebia do exterior elogios, da minha criatividade, de solucionar problemas como quem escova os dentes, a capacidade de improviso, de criar eventos assim de estalo. Fazia também terapias gratuitas e para mim era importante manter ativas as ferramentas, a troca existia, e sentir que fazia o bem, era o melhor pagamento que poderia ter.

E foi nas terapias que as pessoas me começaram a dizer que deveria cobrar, nem que fosse por donativo. Até ter chegado aí, até que isso entrasse na minha cabeça, foi um longo percurso. Mas enquanto não cheguei aí, tive pessoas a oferecerem-me jantares, a trazerem-me prendas como forma de agradecimento. Foi preciso eu ter chegado a dificuldades económicas para perceber que tinha de pôr a donativo. Foi um processo muito bem recebido e confesso que me surpreendi com a generosidade das pessoas. Até tive de criar um mealheiro, pois era-me difícil lidar mesmo com a troca direta. Também passei pelo oposto, ter sentido que o meu tempo não tinha sido valorizado, e aí tive de trabalhar o meu julgamento e aceitar que quando se abre a um processo de donativo, sem mínimo terei de lidar com tudo o que acontece. E até ter integrado e aceitado isto, trabalhei assim, até que chegara o momento de colocar um valor mínimo. Pouco firme ainda na decisão a vida convidou-me aos testes para que firmasse o meu valor e me dignificasse.

A parte de consultora criativa e idiota ainda não cobro, e foi aí que me apercebi há uns anos atrás que infelizmente há quem explore e tente aproveitar, de forma pouco clara. Ainda assim aprendi a lição e quando percebi deixei de alimentar. E o giro foi que recentemente há quem venha ter pedido aconselhamento e ajuda nestas coisas e a primeira coisa que me perguntam é quanto cobro há hora. Fiquei sem jeito e respondi que ajudaria na boa. Senti que estavam a valorizar o meu talento e tempo. E que a minha decisão era consciente, sei que se precisar o universo amanhã me dará a ajuda que precisar, pelo que dou, com a vontade de me doar. Ambas as meninas arranjaram formas mimosas de me retribuir com lanche e prendinhas. Nem seria preciso, mas sei que foi de coração, pelo que recebi também agradecida pelo amor e ternura.

Infelizmente, nós ainda não conseguimos valorizar se não der trabalho, se não exigir esforço e investimento, se não doer. O valor que estamos dispostos a pagar tem a ver com o que representa prioridade para mim. Se eu não considerar prioridade não valorizo. Vou achar demasiado caro, pois não considero um investimento, mas um custo.

Ainda há pouco tempo li um texto de um terapeuta que explicava as razões de cobrar o seu serviço. Está muito associado às terapias espirituais o "dever" ser gratuito, pois há a componente amorosa e de ajuda ao próximo, de serviço. O terapeuta veio também com determinados dons de cura, dons naturais com o propósito de ajudar. Como e porquê cobrar?

Todos nós nascemos com talentos e dons intrínsecos em potência, como os cantores, desenhadores, escritores, desportistas e afins. Mas se não forem desenvolvidos e treinados não passarão disso mesmo, potência, um diamante em estado puro, à espera de ser polido.

E é preciso investir em conhecimento, formações, trabalho interno, muito, livros. No outro dia por curiosidade fui contabilizar, sei que ainda assim deixei muito de fora, foram 8 anos intensivos de estudo, formação, prática, não anotei. E longe de mim saber que estava a ter formação para vir a servir os outros também. Foi para mim, e foi tão útil que a consequência é servir com o que serviu. E partilhar-me.

Não que continue a ser fácil, agora que fiquei com os olhos em bico dos belos milhares que investi em mim, no meu desenvolvimento pessoal, fiquei e estabelecer um valor?

Sei que na altura, tive de selecionar, pois os recursos eram limitados, tive de fazer escolhas sobre as formações a tirar. E sei que houve situações mais baratas que por isso pareceram mais aliciantes disse não, e optei por outras mais dispendiosas, porque me chamaram a atenção a seriedade das pessoas, ou outra qualquer intuição que me direcionou para um lado e não para outro. Podia ter ido a todas, e havia a todo o preço e feitio. Mas houve uma voz muito silenciosa dentro de mim que me orientou para determinados sítios e pessoas que não fazia ideia quem eram. Não foram os mais baratos nem os mais caros, foi o que o meu coração sentiu e recebi conhecimento mais direcionado e passei por pessoas fantásticas que vim a descobrir mais tarde que eram excelentes mestres. Fui muito guiada e acompanhada.

E houve momentos em que critiquei e que reclamei, fónix que esta malta cobra os olhos da cara por 1 dia ou meio dia. Faturam umas centenas ou milhares numa tarde. E isso deixava-me perturbada. Até perceber que o meu julgamento era uma forma de não valorizar ainda o investimento que fazia em mim. Havia uma resistência em querer adentrar cá dentro e aprofundar. Era mais fácil ficar de fora a ver a paisagem, a criticar e à espera de um pequeno deslize para apontar o dedo.

Quando comecei a afrouxar as minhas resistências dei espaço para me abrir e olhar e aí foi mudar a minha crença. Eu estou a investir em mim e valho o valor que estou a investir e vou aproveitar ao máximo. Mudou tudo, não sei bem explicar como, mas comecei a receber as mensagens do que estava a aprender, queria aproveitar até ao último tostão investido. E claro, a minha mente ganhou espaço para receber conhecimento, porque antes estava ocupada a ver as falhas do trabalho, do orador para poder continuar com a ladainha de estes trabalhos são caros.

Hoje não olho para o valor, mas para o âmbito do trabalho, se ressoa em mim, o que me diz e sinto se é para fazer. Às vezes acontece perceber ups, não reúno os recursos para fazer, mas se há uma força cá dentro que diz que sim, inscrevo-me e confio que no momento hão-de aparecer os recursos. Até hoje, sempre apareceram.

No que respeita ao meu valor e ao valor do meu trabalho ainda tenho aprendizagem pelo caminho, mas cada vez mais a compreender por mim e pela minha história a importância de dar valor, de estabelecer como prioridade e investimento. Eu também achava caro, porque achava que não merecia dar-me e "gastar" este dinheiro comigo. Quando eu sou a peça fundamental, o motor e o coração da minha vida.

Ao estabelecer um valor valorizo o meu trabalho, que me permite pagar as contas e reinvestir em mim, para estar constantemente a evoluir na minha melhor versão e dou oportunidade que os outros se olhem e se valorizem ao tomarem a decisão de investir em si mesmos. É um valor de troca que estabelece um compromisso da pessoa que investe em si mesma.

Se não é prioridade, mas curiosidade ver como funciona terapias de desenvolvimento pessoal, não há compromisso. Aí sim, é valor jogado à rua. Ninguém vai andar contigo ao colo. Vai haver muitas vezes que vais ter vontade de bater, xingar, fugir, vai doer, desassossegar, mas no fim vai valer a pena, conhecer a nova pessoa que tens dentro de ti e que não tinhas ainda reparado.



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