AMAdurSer

 


A sensibilidade à flor da pele permitia que o toque lhe penetrasse nas entranhas. Até a suave brisa do vento lhe percorria todo o ser desde a ponta dos pés às raízes do cabelo.  Houvesse uma palavra mais afiada... era o suficiente para lhe ferir o coração. 

Tinha tudo de bom... a capacidade de sentir o mundo dentro de si. E tudo de mau... carregar o mundo no peito. E as lágrimas caíam-lhe. As suas, as dos outros, as que permitia que viessem até si para lhe despertar as fragilidades que de si tinha escondidas.

Ama o teu Ser.... A sua beleza, as suas lágrimas, o seu riso e a alegria boa que lhe sai por todos os poros. Só conhece a alegria quem algum dia navegou nas águas da tristeza.

E ela, conhecia tão bem ser Mar, agora ir aMAr-te era uma batalha armada consigo mesma. Hoje sim, amanhã não. Bem me quer, Mal me quer. E assim ia retirando pétala a pétala, desnudando-se para chegar ao botão, o centro da flor.

E em cada encontro percebia o quanto desencontrada andava de si. Pois claro, que sem dinâmica tudo aparenta estar bem. E ela, forte, de armadura bem posta para andar em frente. Havia que proteger a criança sensível que levava dentro. E anos passaram em que se protegia para que não lhe chegassem à sua intimidade. Era a forma de proteger a sua vulnerabilidade. Não se expunha, não se mostrava. E assim escondida, ninguém tinha de saber ou de chegar à sua vida e ao que ia dentro do seu mundo interior.

E coleccionava histórias dos outros, que a denunciavam com uma pinta tremenda para que ela se pudesse olhar e ver através dos outros. Que amigos e inimigos tão bons, tão mestres que tinha bem perto de si. E lhe faziam navegar num labirinto às voltas. Às vezes de costas voltadas para si, com uma violência tremenda, de nem sequer permitir que a criança pudesse choramingar. "Levanta-te e deixa-te de lamechas, siga caminho" dizia-lhe a generala, sempre de espada em punho.

E essa generala queria-lhe tanto bem. Era o seu jeito, a forma que sabia, para proteger a ternura e doçura da criança linda e maravilhosa que vivia ali. E achava que, se mostrasse seria aniquilada pela maldade do mundo. E a generala também era ela, e tinha toda a maldade para se defender do mundo. E o amor também andava ali, lado a lado.

E a criança amorosa não cria crescer, queria ficar no seu ninho, com as lentes cor de rosa de um mundo encantado, só com flores perfumadas em canteiros ordenados e alinhados numa beleza harmoniosa. E tinha de crescer. 

A geometria sagrada é feita de formas variadas com diversos vértices, é pluriforme, é pluriverso. Cabe tudo. O caos precede a criação. Precisava AmarduSer todas as suas contrariedades e complexidade.

A rosa tem picos e ainda assim é bela. São as feridas, as mágoas que nela ferem. E se todos somos rosas e interagimos uns com os outros vamos picar-nos nos pequenos e grandes toques, recordando que picos temos. E aí.. teremos de olhar para onde nos magoamos. Onde acho que tenho de me defender? Onde acho que me estão a atacar? Onde não imponho os meus limites? Onde compro a ofensa do outro? Porque acho que o outro me está a querer magoar? Que ferida tenho exposta?

O outro está sempre a falar de si. O meu julgamento está sempre a falar de mim.

E se querendo o bem pergunto por ti e há subjacente uma curiosidade, que é só isso, nem mal, nem bem. E do outro lado recebo, na minha miopia, a frieza, o fechamento da porta. Respeito e não prossigo. É também Amar o Ser do outro lado. E acima de tudo, Amar o ser que está aqui deste lado, que se auto-suporta a si mesmo. Que percebe os toques. E reconhece que anteriormente a dureza, os golpes secos, as ausências teriam-lhe feito derramar lágrimas, pois que a devolveriam à ausência de si mesma.

E hoje acompanha-se nos episódios da vida, que a atira para os testes, para o movimento para que perceba onde está e como está. Onde se esquece de si, onde se falta ao respeito. Onde ainda não consegue dizer não, ou dizer sim. E se a vida a convida a ir tomar um pequeno-almoço sozinha, porque a companhia não aparece, sem se justificar. Outrora, podia ser motivo de sentir rejeitada e querer abafar e esconder para que mais ninguém notasse. Vergonha. Vergonhas que aprendeu a carregar por amor, ainda que não lhe pertencesse. 

E cada vez mais percebe, que tem o SEU LUGAR. Escolheu nascer, existir e cada vez mais se orgulha do ser que é e que se vai tornando. Vai-se curando, o mesmo é dizer, tornando inteira. Pouco a pouco, passo a passo. Não há pressa que a vida quer-se saboreada. Com a intensidade de todas as emoções que se querem e precisam de ser sentidas para que aprenda, o que veio para aprender.

E os mestres! Tantos e tão bons. Disfarçados de tantas formas, feitos e graças. Sempre graças abençoadas. É o labirinto, o carrossel, os tais caminhos sinuosos, estreitos e largos que nos têm sempre tudo a oferecer. E amadurecer é integrar todas as emoções em mim, permitir-me ser vulnerável e dar estrutura e utilidade ao que me acontece, sem que eu me torne o acontecimento.

E matur-idade emocional é assumir a experiência do vivido, a sabedoria do experimentado dando-lhe utilidade prática para avançar para a vida. Amar o ser na sua totalidade com tudo o vivido, construir a sua vida com a impermanência das formas. Que as mesmas possam cumprir a função de inspirar a criar novas formas e atividade.

Que eu saiba AMARduSEr cada vez melhor. O meu e o teu... já que afinal somos Partes da mesma UNIDADE. Sigo aprendendo.

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