Celebra


 


Celebrar é cuidar. 

É teres a valentia de olhares com apreciação. E digo valentia, porque tu sabes.... quão fácil é apontares-te o dedo, colocares o "mas" na frase e usares a condicional "poderia fazer melhor".

É preciso valentia para congelares a frame nos instantes presentes sem te desviares nem para trás nem para a frente. E aplaudires-te e ficares orgulhosa de ti. Elogiar-te... por seres o que és.

E hoje sentia a sua Grandeza... orgulho por pisar esta terra. Orgulho nas suas cicatrizes que tanto a tinham feito crescer e permitiam-lhe estar aqui e agora, olhando-se com ternura, amor e vontade de continuar a celebrar-se...cuidar-se melhor.

Há dias assim, em que nos oferecemos flores e nos damos conta do caminho percorrido. Da valentia de estar vivo. E agradeces a ousadia, a coragem dos teus pais que decidiram por amor consciente, subconsciente e supraconsciente ter-te. Apesar das dificuldades, desafios e enfrentando as circunstâncias do caminho puseram-te neste mundo.

O que faço com esta dádiva que me foi dada? A vida? Foi através deles que atravessei o portal e me encarnei.

Como tomo esta vida em cada sopro? É que facilmente nos damos como dado adquirido, as coisas, as pessoas, a vida... e tudo é impermanente, e tudo é uma passagem. E o tempo esgota-se por entre os dedos... que o corpo vem com  validade e pode expirar sem aviso prévio.

E celebras?! Celebras-te?!

E quantas vezes dou por mim descuidada, descabelada, sem brilho, sem chão, de rastos, perdida, acelerada, quieta... e aí como consigo celebrar-me? Parece difícil.... há sempre qualquer coisa que nos agarra à vida. Eu digo que é o Amor.... E ele tantas vezes se revela quando tudo parece estar perdido. Como que uma reanimação que vem para despertar.

E hoje apreciava-se. Estava de bem com a vida. Alegria no coração e sorriso no rosto... apetecia-lhe gritar "EU AMO" e espalhar amor e abraços por aí.

E também chorava de emoção... mais uma vez o milagre da vida juntava os pontos, as sintonias que tudo ligava numa teia perfeita de pessoas, conhecimento, partilhas, músicas, palavras. Assim funciona o campo sistémico na vida diária.

Os presentes. E emocionava-se por incluir mais aceitação dentro de si, de agradecer às feridas que tanto doeram, não querer mudar nem ressignificar, apenas largar. E como isso lhe permitia entregar-se mais e render-se. Confiar no fluxo.

Encarar o que magoa, aceitar que dói e deixar que doa, sem querer arrancar é também celebrar.

Cuidar é estar para mim mesmo quando não cuido. É estar lá, assistir e aceitar que é o melhor que consigo naquele momento. É saber que sou o meu bastão, a minha muleta numa bebedeira que estou lá segurando os meus cabelos enquanto vomito, e estou lá para lavar a cara. E cuidar é também abrir a boca e pedir ajuda. 

E celebrar é incluir os momentos, todos. O dia e a noite. São as feridas, os sintomas que permitem que  a viagem até à raiz e que a cura se encontre. E mesmo que não se encontre... é a jornada de descobertas, os encontros de amor em que me vou tomando em golos cada vez mais saborosos e amorosos.

E os fantasmas vão-se tornando anjos. E as espadas que apontava constantemente para me ferir e armar conflito vão-se tornando cada vez mais transparentes e visíveis... a ponto de as forjar e transformá-las em fertilizante para o meu jardim.

E o jardim floresce a cada dia que passa. E as flores são de tantas espécies e fragrâncias. Que só me resta celebrar e continuar a cultivar.

Pode haver dias em que me vou esquecer de celebrar e que me vai apetecer jogar tudo para o alto... e nesses dias resta-me vir aqui,  recordar as imagens que tenho também criadas dentro de mim e manifestas através das palavras escritas.

E recordar-me o que celebro mesmo?!

Celebro a vida que me dá tanto a todo o momento. Aos pais, ao meu sistema familiar. Graças a eles pude nascer. E todas as intempéries, dissabores, alegrias e sabores são a minha melhor matéria prima para a descoberta e encontro dos meus recursos, talentos e de ir dando propósito e sentido a cada passo, que vai ficando mais alinhado à medida que participo nestas experiências e ensaios sempre em atualização.

Levo dentro este jardim florido em festa. E celebro.

E acordo, e recordo e meto-me de acordo e acrescento novos acordos.

As graças... dou as graças... e celebro.


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