Desacumular




Sempre acumulamos.

Diz que viemos de um registo de fome. Nos tempos idos dos nossos avós e mais para trás a restrição e escassez dos recursos, levava à contenção. Contenção da fome não manifesta, na energia, na gordura... E ainda hoje a fatura vai sendo paga. Vamos encher a dispensa de bens alimentícios, porque amanhã pode faltar. Prevemos, planeamos, provisionamos para gerir e manusear melhor os recursos.

E o que fazemos mesmo?

Raciono os recursos para a eventualidade de uma falta. Consumo já para reter o máximo em mim. E ora estou por carência ou excesso.

E pode ser dinheiro, comida, bens materiais, roupa, sexo, bebida... tudo o que pertence à matéria e me devolve à fisicalidade, e ao senso de saciar os meus cinco sentidos e de segurança. A sobrevivência é o chamado. Tenho de garantir que sobrevivo, que estou protegida.

O que ando mesmo a consumir? O que ofereço ao meu corpo»

A nível físico?
Há alimentos que por si só causam acumulação, para além da quantidade ingerida e do número de refeições que achamos que o corpo precisa. 

Que descanso dou a este veículo, durmo o suficiente para repor a bateria? Exercito o corpo, com desporto? Como equilibro entre a quietude e o movimento?

A nível emocional?
A que emoções me apego, que emoções nutro e como estou a escoá-las? Que movimento lhes dou? Permito-me sentir, que as emoções me atravessem, olhá-las, encará-las e recebê-las? Permito-me vulnerabilizar? Que seja o sentir a minha bússola de orientação para recalibrar o sistema.

A nível mental?
O que dizem os meus pensamentos, que expressam eles? Que informação consumo? A que está preso o meu intelecto?  Eleva-me ou densifica-me... as notícias, filmes, novelas, livros, conversas, formações?
Onde é difícil calar a máquina?

A nível energético?
O que drena a minha energia ou que a recarrega? Onde me disperso? Onde me unifico?

E a dinâmica entre o tomar e o dar é a ordem que nos chama para a dança do equilíbrio. 

E como posso receber se tenho acumulado? Não há espaço para mais. E porque dás na expetativa de receber, não estás apto na realidade a receber. E o que dás mesmo?

As questões vêm para nos abrir à reflexão, para que possamos encontrar e denunciar as mentiras, o escondido até de nós mesmos. É abrir espaço para novas revelações. Só posso conhecer-me se me questionar e me abrir à exploração de mim mesma.


E tanto do que transportamos dentro vem do nosso ADN, da genética, do nosso sistema familiar e do sistema coletivo social. Transportamos memórias ancestrais, impressões gravadas nas nossas células e que fazem o download no nosso comportamento, atitudes, e assim se desenvolve a nossa psique, doenças.

E neste fim de semana ficou gravada esta frase "O que comemos são recordações que nos unem com os nossos antepassados." A profundidade desta frase penetrou-me nas entranhas. Somos muitos, muitos me acompanham, toda a minha linhagem, ainda que eu me faça representar num corpo singular, na vestimenta de uma mulher. E daí vem a minha força e a minha fragilidade. 

É que por amor sigo representando as acumulações, as feridas, os conflitos. E esses pesos carregam, pesam sem que eu tenha consciência que estou fielmente a representá-los. E com consciência, agradecimento por até aqui me terem ajudado a sobreviver e a fazer o caminho que trouxe até aqui, foi o caminho das feridas, da dor, do peso que me fez querer aprofundar nas minhas raízes, por isso foram-me tão úteis. Mas já chega! Agora que me dou conta e me vou dando conta, devolvo as cargas à sua proveniência.

E com amor avanço para o meu destino. E sustenho-me na força das minhas raízes que me permitiram estar aqui, inspiro-me nos seus dons e talentos, na herança que me eleva e desenvolvo a minha divergência, a minha rama própria, a minha ramificação nesta Grande Árvore do meu sistema e do Grande Sistema.

E desacumulo, solto, liberto e assumo a responsabilidade de ser Adulta, caminhar pelos próprios pés, honrar os passos dados, as cicatrizes para servir à vida e ao Grande Espírito. 

E três dias de formação em Constelações Familiares sobre as 5 feridas de Lise Bourbeau, uma viagem na Vida Saudável da Ayurvédica, no sábado, termino hoje com a missa de astrologia com a belíssima frase "Nada em excesso", inscrição no Santuário de Delfos"


Afasta-te portanto de qualquer tipo de vício e não te tornes refém de um hábito. A busca do equilíbrio.  O caminho do meio, o centro. E para isso há que esvaziar.

Ganhar espaço no meio de tanto ruído, informação dentro e fora. E a ayurvédica diz jejua para que o teu corpo possa descansar. Dar descanso ao sistema digestivo e desacumular o excesso de alimento que sempre damos.
 
Para me desidentificar fora, tenho de começar por dentro. Purificando e lavando as impressões.  Observar e vigiar.

E como aprendo? Experimentando na pele, permitindo que a vida me rompa, sacuda e me renove. Aqui estou servindo-me e à vida.
 

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