Presente


A vida está sempre a dar, talvez por isso lhe chamemos Dádiva, presente, milagre. Ela está sempre a acontecer, a jorrar.

Gosto de observar o que me acontece, o que recebo de mim a cada instante, ainda que a presença absoluta me falhe. São tantos os estímulos que me distraem. Mas reparei-me. Despertei silenciosa depois de uma noite agitada. E meditei.

Os contactos com o exterior não tardaram a aparecer. Marcações, combinações, pontos de situação. Para depois me aprontar para para o escritório e começar o dia de trabalho. E hoje especialmente a disciplina, o foco fizeram-se presentes.

Talvez porque lhe esperava ao final do dia uma conversa sobre Ansiedade? É que a mente é brincalhona e quando sabe que o assunto é ela, quer mostrar que se sabe comportar.

Dava-se conta que quanto mais presente, mais lenta se demorava em cada tarefa, em cada palavra, em cada passo. É preciso demorar-se a aprender, é preciso deixar entrar, que se incorpore para que seja realmente sentido e desfrutado. 

E no ritmo acelerado do tempo, das formas, da sociedade que corre, dos prazos, a rodinha do hamster não pára.  E se a mente descansa, pode receber o presente, do presente. E sentir o prazer, o deleite, o gozo. É caminhar com asas e pés no chão.

E falavam-lhe de felicidade. E o que é felicidade?  Há dias felizes... e essa deve ser a prócura... prolongar o estado de harmonia e plenitude perante o que o dia oferece - as oferendas que a vida dá.

Há que aprender e há que receber.

A ânsia por viver faz-te correr demasiado, comer demasiado, mastigar demasiado, falar demasiado, encher demasiado, ler demasiado, aprender demasiado, querer demasiado, consumir demasiado...

Reconheces? Demasiado, demais... e de preferência agora. Há uma parte insaciável que quer preencher, encher para não ver e não se deparar com o vazio existencial que mora dentro.

E enquanto a mente demente estiver ocupada na sua realidade virtual caminhas de olhos vendados para ti.

Como te podes permitir viver sem saber se há caminho no passo seguinte? Onde se desliga o botão do controlo? Onde se sacia a fome que vai dentro?

Tu és o Presente! Recebes-te?

Achas que vieste com defeito, que se enganaram na entrega, que vieste com o chip errado, que não sabes o suficiente, que não tens sentido e propósito. E antes de abrir a caixa já despejaste o rol de defeitos e já estás a perguntar onde se devolve a encomenda.

O giro era se eu pudesse escolher e personalizar o presente à minha maneira, aí sim seria um presente.
Tamanha a arrogância da tua mente que se acha detentora da verdade, e a tua que te identificas com ela.

Como posso declinar-me antes de me conhecer e de experimentar as funcionalidades que levo dentro? O manual de instruções vai sendo dado pela própria vida na experiência. E ao receberes-te, vais ganhando maior clareza e sabedoria a lidar com máquina. E os aparentes "defeitos" são brindes que te ajudam a agilizar, desenvolver destreza e maestria em áreas específicas.

E quando te percebes Presente, estás mais presente e apto a receber os presentes sob as várias formas e meios que te é disponibilizado pelo CTT da Vida.

Ainda que sejas o protagonista da tua vida, a vida não é sobre ti, é para ti. Para que a-prendas, isto é, a tomes, a integres.

E se tomas a VIDA tornas-te VIDA. E se és VIDA, DÁS. Presente.

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