Incomoda-me se faz favor



Queria Paz e a vida trazia-lhe reboliço e inquietude. Começava-se pois a questionar o que realmente andava mesmo a pedir. Sempre que voltava ao eixo e se centrava... lá vinham os zumbidos exteriores desassossegarem. Vinham-lhe fazer festas.... e ela que gostava tanto de festa, lá ia desmandada para a festa, seguindo o ritmo da música... para onde? Para a festa, pois claro.

Nascera Fogo. E tudo o que lhe acendia o entusiasmo e o fogo faziam-na disparar o impulso, e acelerar o pulsar. Gostava tanto de estar viva. E tudo o que lhe despertava o entusiasmo dava-lhe energia redobrada. Não havia meio termo, ou 8 ou 80. E gostava-se assim bera e selvagem.

Impecabilidade! Era a palavra do dia. Ser impecável com a sua chama e propósito. E era. Vinha era com tantos propósitos e áreas de interesse e com o impulse do já, do imediato.

Adorava novidade. E matava-lhe aos poucos a entediante rotina, a prisão do horário, da regra. E poder ser novidade em cada dia,  prendar-se com as simples surpresas de um novo caminho, uma nova música, uma descoberta diária de uma poesia. Precisava desse improviso e incerteza a entrar-lhe pela porta adentro.

E também isso lhe tirava a paz de não saber o que esperar de si no dia.  E talvez a paz para si fosse mesmo esse reboliço, o incómodo de não saber.

Aprender a encontrar a paz e comodidade no incómodo era também a informação que lhe chegava hoje de fora. Observar a sua criança a fazer a birra e deixá-la espernear até se acalmar. Foi uma relíquia que veio ter com ela nas redes sociais.

Tudo comunica. E tanta é a informação  as bênçãos, e os milagres. 

O pedido era para confiar, para se render e deixar que a vida a guiasse. E havia lá de outra?

Estava aprender a resistir menos e a persistir ficar em si, mesmo que esperneasse e fosse incómodo. E a apreciar o valor intrínseco. A reconhecer, a reconhecer-se.

E a energia cria. E a maravilha de criar com a palavra e com os gestos o Amor e vê-lo assim servido no rosto dos outros irmãos e abrir os braços para receber-se no outro... era uma magia muito boa.

Ao receber do outro era a si que se recebia.

E esse incómodo ao qual durante tanto tempo quisera fugir, "não quero incomodar" apenas a incomodava a si mesma por não se pôr cómoda no seu próprio desconforto.

E de repente a cigarra ganha catarro e mete cá fora o que sente, o que pensa e tem limites e valor e princípios. E também eles se confundem e misturam. E hoje é uma coisa e daqui a 2 horas já é outra. E poder receber-se nessa incoerência, instabilidade e inquietude é um mimo.

É que a incerteza não mora lá fora, mora também dentro de si.

Dá medo?! Medo é ter de esconder-se até poder ter a certeza que se pode mostrar, e que a montra está bem montada e equilibrada.

Prefiro, um Foda-se, um esbardalhar... aí ao menos sinto. E se for dor toca... e o que importa é tocar, para que me perceba pele, matéria viva.

Afinal a paz é poder sentir com liberdade o que vai dentro e expressar... e tanto tempo achou que paz era a estabilidade, o linear, o so so, nem quente, nem frio, morno. O neutro, nem carne, nem peixe. Como poderia ela sentir essa paz? Era podre, fria, invisível, indiferente, quando ela era toda sentir quente, ardente.

Precisava de se reconciliar com os conceitos podres,  rebuscados, moralistas que levava dentro, deixar cair certezas, preconceitos. E pôr-se em causa, arriscar, explorar, errar.

E amar mais a aventura e o caso de amor que mantinha consigo mesma.

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